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Educação

A outra face do patrimônio: a necessidade da preservação nas cidades históricas esquecidas de Minas Gerais

Data 13 out 2025Tempo 5 min

Ricardo Nicolau Dias

Minas Gerais é, por excelência, um território da memória. Suas cidades coloniais, com casarios alinhados nas encostas, igrejas monumentais e becos sinuosos, compõem uma paisagem que se tornou símbolo da história brasileira. Congonhas, Ouro Preto, Diamantina, São João del-Rei e Mariana — nomes amplamente reconhecidos e, em alguns casos, elevados à condição de Patrimônio Cultural da Humanidade – são evidências belíssimas desse simbolismo. No entanto, há uma outra face nesse vasto acervo histórico: um conjunto expressivo de cidades e vilas que, embora detenham elementos de grande relevância arquitetônica, urbanística e cultural, permanecem à margem dos olhares institucionais e acadêmicos.

Essas localidades formam uma rede de centros urbanos que não se inserem no circuito tradicional de proteção federal. São cidades como Prados, Serro, Sabará, Pitangui, Catas Altas, Caeté e Santa Luzia. Todas elas guardam edificações coloniais, traçados urbanos preservados e práticas culturais que dialogam diretamente com os grandes centros tombados, mas que, por múltiplos fatores — descentralização dos recursos de preservação, invisibilidade midiática e a falta de ações articuladas entre os níveis de governo — permanecem em situação de vulnerabilidade.

Prados, por exemplo, localizada no Campo das Vertentes, é uma joia esquecida nas montanhas mineiras. Sua história remonta ao século XVIII, abriga um dos conjuntos arquitetônicos mais significativos do interior de Minas. Suas igrejas, como a Matriz de Nossa Senhora da Conceição, e os casarões em adobe e taipa de pilão contam muito sobre a vida cotidiana do período colonial, mas não gozam do mesmo aparato de proteção e visibilidade que Ouro Preto ou a vizinha Tiradentes, por exemplo.

Sabará, ainda que com seu centro histórico tombado, sofre há décadas com a descaracterização de seu entorno, o que é revelador de uma política patrimonial seletiva e fragmentada. A belíssima Igreja de Nossa Senhora do Ó, um raro exemplo de arquitetura religiosa em madeira e taipa, corre risco de deterioração, não apenas física, mas também simbólica, à medida que a cidade cresce de maneira desordenada ao seu redor.

É preciso reconhecer que a centralização dos esforços de preservação em determinados polos, ainda que justificável pela densidade patrimonial dessas cidades e pelo fomento turístico, produz efeitos colaterais que aprofundam desigualdades regionais. A exclusividade dos recursos, da visibilidade e das políticas públicas contribui para a descontinuidade da memória em outras localidades que também participaram ativamente da formação social, econômica e cultural de Minas Gerais.

Neste contexto, o papel da universidade — e, em especial, dos cursos de Arquitetura e Urbanismo, História, Geografia e Ciências Sociais — torna-se fundamental. A academia precisa ampliar seu campo de interesse e pesquisa, superando a visão monumentalista do patrimônio. A valorização da “história menor”, das manifestações do cotidiano, das formas populares de construção e organização dos espaços urbanos, é um caminho necessário para democratizar o entendimento do patrimônio.

A pesquisa acadêmica pode, por exemplo, revelar a complexidade de cidades como Pitangui, uma das primeiras povoações do ciclo do ouro, que hoje se vê comprometida por construções e novas ocupações do tecido urbano sem um plano concreto e confiável de salvaguarda ou sequer um inventário sistemático de seus bens. Pode também impulsionar ações de educação patrimonial em cidades como Catas Altas e Entre Rios de Minas, promovendo o reconhecimento local da importância de seus próprios acervos.

Mais que um exercício técnico, preservar é um ato político. E como tal, exige que o campo da preservação se volte para além do barroco oficial e das cidades “postais” do turismo cultural. Exige escuta, articulação com as comunidades locais, valorização dos saberes tradicionais e, sobretudo, um comprometimento ético com a pluralidade das memórias que compõem nosso território.

O que está em jogo, ao fim e ao cabo, não é apenas a conservação de um conjunto de edificações antigas, mas sim a permanência de uma história que, se não for contada e cuidada, será apagada pelas dinâmicas do mercado e da negligência pública. Cada cidade esquecida carrega um pedaço de Brasil que insiste em existir, mesmo sem verbas, sem editais, sem fomentos e sem tombamentos.

É hora de reequilibrar a balança da atenção patrimonial em Minas Gerais. Para isso, precisamos formar novos profissionais conscientes dessa desigualdade, fomentar políticas públicas descentralizadas e, acima de tudo, reconhecer que o valor do patrimônio não se mede apenas pela imponência de suas fachadas, mas pela densidade das vidas que moldaram — e ainda moldam — seus muros e ruas.

A história de Minas é escrita também por suas cidades silenciosas. Cabe a nós, arquitetos, urbanistas, professores e estudantes, ouvi-las com atenção e agir em sua defesa.

 

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